Li em dois tempos a novela “Conectados & Desconectados”, recentemente publicada pelo amigo Daniel Manzoni. Confirmo minha intuição: esses autores que aprenderam a vida na área da saúde e das biológicas têm uma agudeza de olhar sobre as relações humanas deliciosamente cruel. E Manzoni foi esperto em casar esse olhar cortante com nossa melhor linhagem melodramática, aquela que vira a chave e enfia o pé na jaca da desgraceira como Nelson ou Cassandra, nas mãos dos quais tudo vira tragicomédia. Bem difícil alcançar esse tom, só pra quem tem bastante consciência de nossa brasilidade, de nossas paixões doentias a esmo por um país sem força de lei. Essa novela intensa de 70 páginas usa de forma bem pontual a estrutura das narrativas rocambolescas e policiais para falar da cisheteronormatividade dos gays paulistanos, com especial ênfase para os rapazes de classe média baixa que se ressentem por não ter os mesmos privilégios que os rapazes da Bela Vista e Jardins. Rapazes para quem nenhum amor é destinado, que dirá uma bela união civil com festa e bailado. Claro, sua arena não é só a cena de bares, boates, restaurantes e academias de ginástica que vão do alto ao baixo gueto da cidade, mas principalmente as redes sociais. Os capítulos da novela são estruturados como posts públicos em que um narrador misterioso é quem nos conta essa história que chega às raias do crime. Destaque para as reações abobalhadas de supostos internautas nos comentários que também fazem parte do livro. Gosto bastante como o Daniel consegue apresentar o lado perverso dos homens gays, sem apresentá-los como vítima ou vilões estanques, mas analisando o background social de cada um sem ser pedante. Além da escrita talentosa, creio que este é o ponto que mais destaca essa novela em meio aos dramalhões gays que circulam por aí. Ansioso por mais histórias assim. Abaixo deixo um gostinho da novela:
quinta-feira, 23 de dezembro de 2021
“Conectados & Desconectados”, de Daniel Manzoni
Li em dois tempos a novela “Conectados & Desconectados”, recentemente publicada pelo amigo Daniel Manzoni. Confirmo minha intuição: esses autores que aprenderam a vida na área da saúde e das biológicas têm uma agudeza de olhar sobre as relações humanas deliciosamente cruel. E Manzoni foi esperto em casar esse olhar cortante com nossa melhor linhagem melodramática, aquela que vira a chave e enfia o pé na jaca da desgraceira como Nelson ou Cassandra, nas mãos dos quais tudo vira tragicomédia. Bem difícil alcançar esse tom, só pra quem tem bastante consciência de nossa brasilidade, de nossas paixões doentias a esmo por um país sem força de lei. Essa novela intensa de 70 páginas usa de forma bem pontual a estrutura das narrativas rocambolescas e policiais para falar da cisheteronormatividade dos gays paulistanos, com especial ênfase para os rapazes de classe média baixa que se ressentem por não ter os mesmos privilégios que os rapazes da Bela Vista e Jardins. Rapazes para quem nenhum amor é destinado, que dirá uma bela união civil com festa e bailado. Claro, sua arena não é só a cena de bares, boates, restaurantes e academias de ginástica que vão do alto ao baixo gueto da cidade, mas principalmente as redes sociais. Os capítulos da novela são estruturados como posts públicos em que um narrador misterioso é quem nos conta essa história que chega às raias do crime. Destaque para as reações abobalhadas de supostos internautas nos comentários que também fazem parte do livro. Gosto bastante como o Daniel consegue apresentar o lado perverso dos homens gays, sem apresentá-los como vítima ou vilões estanques, mas analisando o background social de cada um sem ser pedante. Além da escrita talentosa, creio que este é o ponto que mais destaca essa novela em meio aos dramalhões gays que circulam por aí. Ansioso por mais histórias assim. Abaixo deixo um gostinho da novela:
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